
ESG global: Avanços regulatórios e desafios no Brasil.
Por: Dra. Denise Curi, PhD.
Nos últimos anos, o termo ESG (ambiental, social e governança) saiu das pautas especializadas e ganhou protagonismo no centro das decisões empresariais, políticas e financeiras.
O que antes era tratado como um diferencial reputacional hoje se tornou um requisito de competitividade — especialmente no cenário internacional.
Dentro desse contexto, com a intensificação das mudanças climáticas, crises geopolíticas e pressões sociais por mais transparência, o mundo corre para definir novos parâmetros para os negócios do século XXI.
No entanto, essa corrida não acontece em linha reta. De um lado, organismos internacionais como o ISSB e blocos econômicos como a União Europeia avançam em regulações e padrões de reporte cada vez mais exigentes.
De outro, líderes políticos influentes e setores econômicos tradicionais reagem, ao mesmo tempo, questionando a velocidade — e até a legitimidade — dessa transformação.
Neste artigo, analisamos como essa disputa global impacta diretamente as empresas brasileiras, que se veem diante de uma encruzilhada: adaptar-se às novas regras e conquistar espaço nos mercados globais, ou correr o risco de ficar para trás em um mundo que exige, cada vez mais, coerência entre discurso e prática.
Como a nova agenda ESG internacional impacta diretamente as empresas brasileiras
O mundo está em plena corrida para definir as regras de um novo jogo econômico, onde sustentabilidade, governança e responsabilidade social deixaram de ser temas periféricos para ocupar o centro das decisões empresariais e políticas.
Em 2025, esse cenário se intensifica com a consolidação de padrões globais de reporte ESG, liderados pelo International Sustainability Standards Board (ISSB) e pelas diretrizes cada vez mais rígidas da União Europeia, como a CSRD e os ESRS.
No entanto, apesar do avanço regulatório, essa agenda enfrenta resistência crescente.
Líderes como Donald Trump, Vladimir Putin e Recep Tayyip Erdoğan têm vocalizado críticas contundentes ao que chamam de “agenda verde”, argumentando que normas ESG interferem no crescimento econômico ou atendem a interesses ideológicos.
Grupos ligados ao petróleo, mineração e agronegócio também têm exercido forte lobby para desacelerar essa transição — uma pressão que já surte efeitos práticos.
A resposta da União Europeia: o pacote Omnibus
Dentro desse cenário, mesmo sendo uma das regiões mais comprometidas com a transição sustentável, a União Europeia cedeu à pressão de setores produtivos e políticos, anunciando em 2024 o pacote “Omnibus”.
Trata-se de uma revisão das regras de reporte que propõe reduzir a quantidade de indicadores obrigatórios e flexibilizar prazos de adaptação, especialmente para pequenas e médias empresas.
Entretanto, a medida não representa um retrocesso completo, mas sinaliza que nem mesmo os países mais avançados no tema estão imunes à disputa entre ambição ambiental e viabilidade econômica.
A saber, a própria Comissão Europeia reconheceu a necessidade de equilibrar sustentabilidade com competitividade global, num momento em que os EUA e a China adotam abordagens menos regulatórias e mais focadas em incentivos.
E o Brasil?
Para o Brasil, esse cenário é desafiador e repleto de implicações.
De um lado, há oportunidades claras para empresas que se anteciparem às exigências globais, ganhando acesso a mercados exigentes como o europeu, atraindo capital internacional e consolidando reputação.
De outro, o país ainda carece de uma estratégia nacional clara e coordenada para integração às normas ESG globais.
Embora a CVM tenha avançado com a Resolução 193, que estabelece diretrizes de reporte alinhadas ao ISSB para companhias abertas, ainda falta uma política pública mais ampla e transversal, sobretudo, que inclua incentivos, fiscalização e apoio às empresas de médio e pequeno porte.
Além disso, a ausência dessa integração sistêmica pode isolar empresas brasileiras ou forçá-las a correr atrás do prejuízo quando normas internacionais passarem a ser exigidas por parceiros comerciais, cadeias de suprimento ou investidores internacionais.
A cadeia de exportação do agronegócio, por exemplo, poderá ser fortemente impactada caso não consiga comprovar conformidade com regras de rastreabilidade, uso de recursos naturais e direitos humanos.
Adicionalmente, o mesmo vale para setores como mineração, energia e moda, que enfrentam crescente pressão global por práticas sustentáveis e transparentes.
O que as empresas brasileiras devem fazer agora
Mesmo diante de um cenário internacional ambíguo, a adaptação é inevitável.
A boa notícia é que as regras estão ficando mais claras. O ISSB, por exemplo, já publicou os padrões IFRS S1 e S2, que servem de base para relatórios ESG focados em riscos e oportunidades financeiras.
A UE, apesar da simplificação com o pacote Omnibus, mantém firme seu compromisso com os princípios da dupla materialidade — ou seja, olhar tanto para os impactos do mundo nos negócios quanto dos negócios no mundo.
Diante disso, empresas brasileiras podem começar por:
- mapear os riscos e oportunidades ESG mais relevantes para seus setores;
- alinhar seus relatórios aos padrões do ISSB e GRI, com foco em comparabilidade e transparência;
- investir em capacitação e governança interna, evitando que ESG seja tratado apenas como uma área de marketing ou compliance; e
- estabelecer metas públicas e auditáveis, especialmente em temas como emissões, direitos humanos e diversidade.
O futuro será decidido agora
Apesar das críticas, retrocessos e resistências políticas, a agenda ESG segue avançando — não como um modismo, mas como uma exigência de um mercado em transformação.
De fato, os investidores já precificam riscos climáticos. Os consumidores cobram coerência das marcas. As cadeias globais exigem responsabilidade compartilhada.
Em vez de esperar um consenso global que talvez nunca venha, as empresas brasileiras precisam agir com inteligência estratégica.
Portanto, quem se mover primeiro terá mais chances de conquistar novos mercados, atrair investimentos sustentáveis e construir valor de longo prazo. Quem adiar demais, pode acabar fora do jogo.
Sobre a Dra. Denise Curi, PhD.

Doutora em Engenharia de Produção, com foco em Orientação para o Mercado em Empresas de Tecnologia pela Escola Politécnica da USP, São Paulo, Brasil, e equivalência em Gestão Industrial pela Universidade de Aveiro (janeiro de 2019).
Mestre e Bacharel em Administração de Empresas na área de Cultura Organizacional e Gestão da Qualidade, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Desde 2018, vive na cidade do Porto, onde é investigadora na Universidade de Aveiro.
Atualmente, dedica-se à Denpec Desenvolvimento Profissional e Consultoria desde 2014, onde auxilia organizações a integrar sustentabilidade e inovação em suas estratégias de negócios.
Sua carreira executiva inclui cargos no Grupo Rhodia SA (atual Solvay), HTMG Marketing Internacional, Sharp e Banco Real, nas áreas de Planejamento Estratégico, Marketing, Sustentabilidade e Controladoria.
Teve um papel fundamental na implementação da reciclagem de PET em larga escala no Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, trabalhando em parceria com empresas como Coca-Cola Company, Pepsi Company, Ambev, Plastivida, Cempre e Cadibisa.
Na área acadêmica, ministrou aulas na FIA-USP (Fundação Instituto de Administração), Centro Paula Souza e Universidade Mackenzie, onde coordenou a Agência Mackenzie de Sustentabilidade e o Curso de Pós-Graduação em Governança Corporativa, Responsabilidade Social e Sustentabilidade.
É autora do livro “Gestão Ambiental” (Editora Pearson), além de diversos artigos e capítulos de livros sobre sustentabilidade e inovação sustentável no Brasil e no exterior. Foi vencedora dos prêmios de Melhor artigo científico na área de indicadores de sustentabilidade (Engema) e Melhor orientação de trabalho de conclusão de curso (ABIT), e atuou como jurada na Primeira Edição do Prêmio ABIHPEC-Beleza Brasil, na modalidade Cosméticos Sustentáveis.
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